Chimarrão da Madrugada - Aureliano de Figueiredo Pinto
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Chimarrão da Madrugada - Aureliano de Figueiredo Pinto
CHIMARRÃO DA MADRUGADA
Aureliano de Figueiredo Pinto
Não sei por que nesta noite
o sono velho cebruno
ergueu a crina e se foi!
E eu que arrelie ou me zangue.
Tenho olhos de ave da noite,
ouvidos de quero-quero,
cordas de viola nos nervos
e uma secura no sangue...
Então, da marquesa salto
e vou direito ao galpão:
bato tição com tição
e a lavareda clareia
os caibros do galpão alto.
Já a cuia bem enxaguada,
corto um cigarro daqueles
de reacender vinte vezes
num trote de quatro léguas
de um chasqueira troteada.
E, quando a chaleira chia,
principio um chimarrão,
mais verde e mais topetudo
do que um mate de barão.
Me estabeleço num banco
pra gozar gole e fumaça,
pitando um naco de branco.
e entre tragada e golito
saludo mui despacito
cada recuerdo que passa.
Um galo - o cochincho-mestre!
o laço desenrrodilha.
E fica só com a presilha
e solta a armada bem grande
do laço de um canto largo
de sobrelombo a uma estrela.
E os outros galos-piazitos
vão atirando os lacitos
como em guachas de sinuelo.
E até um garnisé cargoso
vai reboleando orgulhoso
o soveuzito feioso
feito de couro com pêlo.
Nem relincham os cavalos!
com brilhos de ponte-suelas,
já em riba estão as estrelas!
Cá em baixo os cantos dos galos.
A estrela d’alva trabalha
na imensidão da hora morta:
- ou num perfil de medalha
ou a maiúscula inicial
sobre a prata de um punhal
que ainda há de sangrar um dia.
E a “Nova” ao largo se corta,
magra, esquilada, arredia,
empurrando a guampa torta
contra o ventito do Sul,
como num campo de azul
a ovelha chamando a cria.
Solito, perto do fogo,
como um bugre imaginando,
escuto o tempo rodando
sem descobrir o seu jogo.
O perro baio-coleira
faz que cochila... E abre os olhos,
a espaços, regularmente.
E me fixa os olhos claros
como um amigo, dos raros,
cuidando do amigo doente.
É um gosto olhar os brasidos
e os luxos das lavaredas
dançando rendas e sedas
para a ilusão dos sentidos.
E entre o amargo e atragada
tranqueiam na madrugada
tantos recuerdos perdidos.
E o chimarrão macanudo
vai entrando pelo sangue!
Vai melhorando as macetas,
curando as juntas doridas
como água arisca de sanga
sobre loncas ressequidas.
O peito avoluma e arqueia
como cogote de potro.
E as ventas se abrem gulosas
por cheiro de madrugada.
- Potrilhos em disparada
num setembro de alvoroto.
Ah! sangue velho... Descubro
porque hoje estás de vigília:
- Dois séculos de Fronteiras,
de madrugadas campeiras,
de velhas guardas guerreiras
bombeando pampa e coxilha!
Por isso é que hoje não dormes!
Ouviste a voz de ancestrais:
- “O chimarrão principia!
Alerta! O campo vigia!
Da meia noite pra o dia
um taura não dorme mais...
Copiada do site www.ctgtropeirosdaquerencia.com
Aureliano de Figueiredo Pinto
Não sei por que nesta noite
o sono velho cebruno
ergueu a crina e se foi!
E eu que arrelie ou me zangue.
Tenho olhos de ave da noite,
ouvidos de quero-quero,
cordas de viola nos nervos
e uma secura no sangue...
Então, da marquesa salto
e vou direito ao galpão:
bato tição com tição
e a lavareda clareia
os caibros do galpão alto.
Já a cuia bem enxaguada,
corto um cigarro daqueles
de reacender vinte vezes
num trote de quatro léguas
de um chasqueira troteada.
E, quando a chaleira chia,
principio um chimarrão,
mais verde e mais topetudo
do que um mate de barão.
Me estabeleço num banco
pra gozar gole e fumaça,
pitando um naco de branco.
e entre tragada e golito
saludo mui despacito
cada recuerdo que passa.
Um galo - o cochincho-mestre!
o laço desenrrodilha.
E fica só com a presilha
e solta a armada bem grande
do laço de um canto largo
de sobrelombo a uma estrela.
E os outros galos-piazitos
vão atirando os lacitos
como em guachas de sinuelo.
E até um garnisé cargoso
vai reboleando orgulhoso
o soveuzito feioso
feito de couro com pêlo.
Nem relincham os cavalos!
com brilhos de ponte-suelas,
já em riba estão as estrelas!
Cá em baixo os cantos dos galos.
A estrela d’alva trabalha
na imensidão da hora morta:
- ou num perfil de medalha
ou a maiúscula inicial
sobre a prata de um punhal
que ainda há de sangrar um dia.
E a “Nova” ao largo se corta,
magra, esquilada, arredia,
empurrando a guampa torta
contra o ventito do Sul,
como num campo de azul
a ovelha chamando a cria.
Solito, perto do fogo,
como um bugre imaginando,
escuto o tempo rodando
sem descobrir o seu jogo.
O perro baio-coleira
faz que cochila... E abre os olhos,
a espaços, regularmente.
E me fixa os olhos claros
como um amigo, dos raros,
cuidando do amigo doente.
É um gosto olhar os brasidos
e os luxos das lavaredas
dançando rendas e sedas
para a ilusão dos sentidos.
E entre o amargo e atragada
tranqueiam na madrugada
tantos recuerdos perdidos.
E o chimarrão macanudo
vai entrando pelo sangue!
Vai melhorando as macetas,
curando as juntas doridas
como água arisca de sanga
sobre loncas ressequidas.
O peito avoluma e arqueia
como cogote de potro.
E as ventas se abrem gulosas
por cheiro de madrugada.
- Potrilhos em disparada
num setembro de alvoroto.
Ah! sangue velho... Descubro
porque hoje estás de vigília:
- Dois séculos de Fronteiras,
de madrugadas campeiras,
de velhas guardas guerreiras
bombeando pampa e coxilha!
Por isso é que hoje não dormes!
Ouviste a voz de ancestrais:
- “O chimarrão principia!
Alerta! O campo vigia!
Da meia noite pra o dia
um taura não dorme mais...
Copiada do site www.ctgtropeirosdaquerencia.com
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